JOGOS OLÍMPICOS DE
ATENAS 1896
Leon Flameng
“Desportivismo puro”
“Uma avaria mecânica obrigou o grego a encostar à
berma da pista do velódromo - espanto para quem assistia, o francês Leon
Flameng, de imediato, interrompeu também a sua prova e foi ao encontro do
adversário - chegou-se até junto de
Georgios Kolletis e ajudou-o a solucionar o problema“
Jogos Olímpicos de
Atenas, 1896, a primeira edição da Era Moderna - de todas as modalidades
integrantes, no ciclismo, a prova dos cem quilómetros demarcou-se como a mais
penosa, com o desempenho da maioria dos atletas a quedar-se por um nível muito
aquém das expectativas geradas.
De uma dezena de ciclistas participantes, somente dois, o francês Léon Flameng e o grego Geórgios Kolletis, conseguiram demonstrar valia e capacidade para tão custosa tarefa - uma prova, inicialmente destinada para um percurso de estrada acabou por ser realizada no Velódromo de Falero ou de Nova Faliro onde, trezentas voltas completaram e justificaram a distância estabelecida. Esta infraestrutura, destinada às provas de ciclismo, haveria de, posteriormente, ser transformada no Estádio Karaiskakis, e tinha os seus planos de construção inspirados no velódromo francés de Arcachón, uma sugestão de Pierre de Coubertin.
Com um já considerável número de quilómetros vencidos, os dois atletas foram-se distanciando do resto do pelotão, um reduzido número que ia ficando para trás, acusando a fraqueza das suas pernas - o francês e o grego foram, em gradual vantagem, sugando o resto do percurso.
De repente, o azar
colou-se a um deles!
Uma avaria mecânica
obrigou o grego a encostar à berma da pista e, espanto para quem assistia, Leon
Flameng, de imediato, interrompeu também a sua pedalada e foi ao encontro do
adversário - uma atitude de puro desportivismo, um comportamento que haveria,
no futuro, ser apodado de fair-play, um neologismo a vogar pelos
meandros da língua mas, infelizmente, hoje, gasto de tão evocado mas não
cumprido, nem respeitado como merecia!
O gesto do francês
constituía, sem dúvida, a expressão de um genuíno e saudoso tipo de atitude
humana, esse tão bafejado desportivismo, naquele tempo vivido e liberto ainda
das desmesuradas pressões que no futuro o iriam abastardar - tributo a Pierre
de Coubertin que, numa atitude pedagógica, sempre defendeu e valorizou o
interesse “na participação desportiva, independentemente do resultado”. O
episódio, agora evocado, deverá ser considerado, como a primeira, conhecida e
oficial amostragem da perene demonstração desse mesmo autêntico espírito
olímpico.
A Grécia recebia os
primeiros Jogos Olímpicos da Era Moderna, dois anos decorridos sobre o
Congresso da Sorbornne, em Paris, em 23 de Junho de 1894, uma assembleia magna
que reuniu personalidades de vários países e de onde brotou a formação do Comité
Olímpico Internacional - Pierre de Coubertin via, assim concretizado o seu
desejo da recriação olímpica e a internacionalização daquele fenómeno
desportivo: dez países, trezentos e onze atletas e nove modalidades desportivas
presentes em Atenas para a sua efetivação.
Retomando o fio
motivador, no desenrolar da referida prova de ciclismo, a supremacia de ambos,
do francês e do grego, foi sendo demonstrada e conforme a distância ia sendo
cumprida, quilómetro a quilómetro, ambos foram deixando fora de hipótese os
restantes ciclistas, numa época em que a modalidade ainda se apresentava muito
insipiente.
Leon Flameng ajudou
mesmo Geórgios Kolletis a solucionar o problema mecânico. Após a reparação da
avaria, ambos montaram, novamente, as suas máquinas e deram continuidade à
pedalada, rumo à meta. Coube ao francês o mérito e a satisfação de a cortar em
primeiro lugar, com algum avanço sobre o grego - um prémio duplo - gastou 3h 8m
e 19s para satisfazer aqueles cem quilómetros
tornava-se campeão olímpico.
Leon Flameng foi
levado em triunfo pelos espectadores mais entusiasmados, um magote de assistentes de entre os possíveis
vinte mil presentes que vibrou com o seu êxito - cortaria a meta com uma
bandeira francesa, ondulante, presa a uma das pernas. Nestes Jogos de Atenas de
1896, Flameng ainda conseguiu o segundo lugar na prova de 10 quilómetros com o
mesmo tempo do seu compatriota Paul Masson, gastando dezassete minutos,
cinquenta e quatro segundos e duas décimas - foi terceiro na prova de sprint
com o tempo de 27 segundos.
Independentemente da popularidade granjeada naqueles Jogos Olímpicos de
Atenas, Flameng gozava já de um certo prestígio entre os franceses embora
tivesse confessado o seu desagrado por nunca ter participado num campeonato
mundial. Ficou como um herói da sua pátria.
Quando participou nos
Jogos Olímpicos de Atenas, em 1896, contava apenas dezanove anos de idade,
muito novo ainda quando, na presença do monarca grego, George I, recebeu a
Medalha que ficaria para a história como o primeiro campeão olímpico do
ciclismo.
Dez anos decorridos, iria tombar, incluído no extenso rol dos atletas olímpicos imolados na Primeira Grande Guerra, uma morte adiada porque já antes havia passado por momentos aflitivos. Era piloto aviador e no posto de sargento, no dia 21 de Junho de 1916, quando realizava um voo de reconhecimento sobre Verdun, foi surpreendido por um ataque inimigo – o companheiro, o piloto navegador, foi abatido e ele mesmo sofreu um tiro no rosto, um desastre que não o impediu de continuar ao comando do seu avião e conseguir chegar a terra firme. Miraculosamente, havia sobrevivido e após ser retirado da carlinga, seguiu para um hospital de campanha em Vadelaincourt onde sofreu uma intervenção cirúrgica e foi alvo de uma cuidada atenção.
Três meses
decorridos, apesar de ainda estar sob vigilância, tomou a decisão de abandonar
o hospital e continuar a tarefa que havia sido interrompida, mesmo contrariando
os avisos médicos – uma teimosia justificada pelo seu espírito guerreiro e o
seu amor à pátria, reconhecido por duas citações para a Cruz de Guerra.
Após retomar as
funções de piloto, Flameng iria realizar voos de reconhecimento nas regiões de
Thionville, Hayange e Rombach, as zonas mais afetadas pela ação inimiga.
Pilotava um bimotor numa missão de ensaio e foi num desses testes que iria
encontrar a morte devido a uma avaria mecânica - a máquina despenhou-se e ele
não foi capaz de abrir o paraquedas.
Um campeão infeliz!
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